Em abril de 1913, o chefe-de-polícia do Rio de Janeiro declarou que “o jogo permaneceria liberado até que o governo resolvesse o contrário". No dia 2 de maio, os repórteres Castellar de Carvalho e Eustáquio Alves, do jornal “A Noite”, instalaram no largo da Carioca uma roleta com o cartaz “Jogo franco! Roleta de 32 números – Só ganha o freguês”.
Logo formou-se ao redor uma multidão, com muita gente querendo “fazer uma fezinha”. Então, a polícia interveio levando a roleta e o cartaz, sob os protestos dos “banqueiros”, que acusavam o delegado responsável pelo confisco de “estar desrespeitando uma determinação de seu próprio chefe”.
A edição do jornal naquele dia foi um sucesso, encerrando a narração do incidente com uma ameaça: “E cá está a roleta para uma nova fezinha se o senhor doutor chefe-de-polícia continuar a fazer declarações tão patetas”.
Passados três anos e alguns meses, em outubro de 1916, numa resposta a uma nova matéria de “A Noite” sobre a jogatina, outro chefe-de-polícia, Aurelino Leal, resolveu “agir” enviando à imprensa cópia de um ofício dirigido aos delegados distritais, ordenando-lhes lavrarem autos de apreensão de apetrechos de jogo encontrados nos clubes infratores, só que “antes de qualquer providência” o chefe “deveria ser avisado pelo telefone oficial”.
Coincidindo o fato com o lançamento do samba-maxixe “Pelo Telefone”, de estrondoso sucesso, alguém lá na redação de “A Noite” (segundo Henrique Foréis Domingues, o Almirante, em matéria no “O Dia”, em 13.02.1972), inspirando-se nos episódios em questão, criou a famosa paródia:
“O chefe-de-polícia pelo telefone
Mandou me avisar
Que na Carioca tem uma roleta
Para se jogar...”
Se Mario de Andrade fosse comentar essa historinha, certamente diria: “Mas isso é tão Brasil...”
A propósito: “Pelo Telefone”, apesar de sua estrutura ingênua e desordenada, é de extraordinária importância para a história de nossa música popular, pois marca, digamos, “o nascimento oficial” do gênero samba, e inicia o longo ciclo de sucesso da canção carnavalesca tradicional.