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As orquestras femininas goianas e o feminismo

17/07/2023 - Sarah Orioli Emídio de Souza, Othaniel P. de Alcântara Jr.

Resumo: Este artigo traz os resultados parciais de uma investigação referente ao Trabalho de Conclusão de Curso, cujo objetivo de pesquisa é a participação de mulheres na música orquestral na cidade de Goiânia. Historicamente, sabe-se que foram criadas apenas duas orquestras femininas na Capital do Estado de Goiás. A primeira delas, regida por Jean François Douliez, manteve-se em funcionamento entre os anos de 1959 e 1961. A segunda, por sua vez, idealizada pelo maestro Eliseu Ferreira da Silva, realizou concertos nos anos de 2019 e 2020, sob a direção da maestrina Katarine Araújo. Inicialmente, o presente texto pretende traçar um paralelo entre esses dois conjuntos instrumentais por meio da comparação de alguns elementos próprios do universo musical (repertório etc.), além de outros elementos de caráter contextual (histórico, social, cultural etc.). Ademais, será explorada a interface entre Música e Gênero, uma das temáticas que demonstram um viés de crescimento nas discussões acadêmicas atuais.

Palavras-chave: Música Orquestral; Gênero; Feminismo; Mulheres performers; Goiânia.

INTRODUÇÃO

O conteúdo deste artigo descreve o resultado parcial de uma investigação que, por hora, explora a intersecção de temas abordados em duas pesquisas, as quais se encontram em andamento. São elas: 1) A música sinfônica em Goiânia: uma abordagem histórica, política e sociocultural, conduzida, em nível de doutoramento, pelo Professor Othaniel Alcântara; 2) As orquestras femininas de Goiânia e o feminismo, realizada pela discente Sarah Orioli Emídio Souza, esta que, posteriormente, será formatada como Trabalho de Conclusão do Curso de Bacharelado em Instrumento Musical - Flauta Transversal, curso este vinculado à Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás (EMAC/UFG).

Inicialmente, foi efetuada uma revisão de contexto histórico referente tanto ao universo musical goiano quanto àqueles alusivos à formação social e cultural da sociedade brasileira. Nessa trilha, buscou-se respaldo nas ideias de Joseph Kerman (1924-2014) registradas em Contemplating Music: Challenges to Musicology (1985) - traduzido para o português sob o título Musicologia (1987). Nessa obra, em síntese, o autor contrapõe a imagem de uma disciplina conservadora e reacionária estruturada por Guido Adler (1855-1941) a partir da “doutrina positivista” de Auguste Comte (1798-1857) em favor de uma nova direção para as pesquisas históricas, isto é, numa direção mais crítica e inclusiva.

Concordando com Beatriz de Magalhães de Castro (2016, p. 126) e Maria Alice Volpe (2016, p. 126), o pronunciamento crítico de Joseph Kerman, entre outros autores, somado às considerações de vários teóricos - a exemplo de Leo Treitler (n. 1931) - repercutiram na geração seguinte de musicólogos. Tal geração deixou suas contribuições na recorrente “elaboração revisional, percorrendo e rediscutindo campos, eixos teóricos-conceituais e seus paradigmas” (Castro, ibidem). Abre-se, então, o capítulo da chamada New Musicology.

Os adeptos da “Nova Musicologia”, por sua vez, conforme esclarecem Diósnio Machado Neto e Leonardo Salomon Tramontina, caminharam no sentido de atribuir “maior relevância à música enquanto agente aglutinador e produtor de símbolos e significados individuais e socioculturais”. Com esse propósito, novas perspectivas de estudo foram oportunizadas, tais como: da recepção da obra de arte, da performance, da música popular, da indústria cultural, das relações dos sons com o corpo e com o prazer e, ainda, aqueles relativos a gêneros (MACHADO NETO; TRAMONTINA, 2011, p. 08). Nesse contexto, os citados musicólogos chamam a atenção para a valorização de dois importantes aspectos: a “alteridade” - com ênfase na figura do “excluído”, subalterno ou “inferior” - e o estudo das “estruturas e padrões de exclusão”.      

Permeando esse conjunto de ideias, deve-se ter em mente que, em particular, os objetos de pesquisa concernentes à inserção da mulher nas argumentações pertinentes às investigações acadêmicas e textos musicológicos demandam um maior contato com algumas das teorias advindas da crítica feminista1. Aqui, é importante esclarecer que Susan McClary (n.1946), ao publicar, em 1991, seu livro Feminine Endings: Music, Gender and Sexuality, assumiu o papel pioneiro da convergência da crítica feminista e Musicologia. De fato, em seu trabalho, ao averiguar processos, códigos e técnicas composicionais como forma de produzir “significado”, Susan McClary explora a dualidade2 “feminino” e “masculino” na música, além de uma suposta maneira3 feminina de compor. E, por conseguinte, a autora impulsionou o surgimento, nos anos que se seguiram, de uma pluralidade de perspectivas inerentes a estudos que abordam a relação entre as mulheres e as diversas atividades musicais.

É nesse universo que se encontra um dos eixos temáticos de maior interesse para a presente pesquisa. Trata-se daquele que possui um viés de cunho mais sociológico. Utilizando o raciocínio de Diósnio Machado Neto e Leonardo Solomon Soares Tramontina (2011, p. 02), nesta senda busca-se analisar “as funções e representações da mulher nas práticas comunitárias socioeconômicas e culturais ligadas à música”.

A presente pesquisa pretende examinar a representatividade da mulher no bojo da produção musical sinfônica goianiense, mais especificamente quanto ao engajamento, ou não, dessas musicistas, sobretudo em debates acerca de questões de gênero e de feminismo.

O FEMINISMO E A MÚSICA      

Para o sociólogo espanhol Manuel Castells, o patriarcalismo é uma das estruturas sobre as quais se assentam praticamente todas as sociedades contemporâneas. E, para que a autoridade imposta em âmbito familiar, do homem sobre mulher e filhos possa ser exercida, “é necessário que o patriarcalismo permeie toda a organização da sociedade, da produção e do consumo à política, à legislação e à cultura” (CASTELLS, 2018, p. 298). No entendimento de Jane Mansbridge, secundada por Castells, o feminismo, por sua vez, ao negar os paradigmas daquela família patriarcal, tem como essência

(...) a (re)definição da identidade da mulher: ora afirmando haver igualdade entre homens e mulheres, desligando do gênero diferenças biológicas e culturais; ora, contrariamente, afirmando a especificidade da mulher, frequentemente declarando, também, a superioridade das práticas femininas como fontes de realização humana; ou ainda, declarando a necessidade de abandonar o mundo masculino e recriar a vida, assim como a sexualidade, na comunidade feminista. (MANSBRIDGE apud CASTELLS, 2018, p. 298).

Destarte, observa-se que o movimento feminista é extremamente variado, seja na prática ou em seus diferentes discursos. E, a respeito da cultura sexista, percebe-se que a ideia de mudar esse status quo foi e continua sendo uma tarefa penosa (ADICHIE, 2012, p. 48). Mesmo assim, historicamente, no mundo ocidental, há diversos relatos históricos de pessoas do chamado sexo “frágil” que se rebelaram contra essa condição de “dominação masculina”. A pesquisadora Céli Regina Jardim Pinto lembra que, por muitas vezes, ao assumir o ônus desses conflitos, diversas mulheres acabaram, até mesmo, perdendo suas próprias vidas (PINTO, 2010, p.15). Quem não se lembra dos tempos de Inquisição da Igreja Católica? Seguindo esse caminho, Céli Pinto comunica que a primeira onda conhecida do movimento feminista aconteceu na Inglaterra, a partir das últimas décadas do século XIX, quando, dentre outras demandas, a que mais se popularizou foi o direito ao voto, no que ficou conhecido como “movimento sufragista”.        

Ao abordar essa temática, em seu livro O poder da identidade, o autor Manuel Castells limita seu histórico e análise acerca do feminismo enfatizando o movimento feminista contemporâneo, a respeito do qual assevera o sociólogo: “irrompeu primeiro nos Estados Unidos no fim dos anos 1960 e depois na Europa no início da década de 1970, difundindo-se pelo mundo inteiro nas duas décadas seguintes” (CASTELLS, 2018, pp. 297-298). Cumpre informar que, além dos aspectos históricos, entre outras discussões, Castells focaliza as características comuns entre as diversas vertentes do feminismo, as quais buscam convergir para o aspecto social transformador. Nessa conjuntura, sublinha-se que tal movimento “desafia o patriarcalismo ao mesmo tempo que esclarece a diversidade das lutas femininas e seu multiculturalismo” (CASTELLS, 2018, p. 298).

Especialmente no universo da música clássica, documentadamente, constata-se que, por muito tempo, se tratou de um espaço quase que exclusivamente masculino. Quantas compositoras, principalmente entre aquelas nascidas nos séculos XVII, XVIII e XIX, fazem parte do cânone musical erudito? E, em particular, no século XIX, nos tempos do culto ao virtuosismo técnico, além de Clara Schumann, quantas intérpretes foram celebradas?

Neste sentido, um aspecto já bastante debatido na historiografia musical encontra-se aqui fundamentado nas palavras da pesquisadora Catarina Leite Domenici. Trata-se da conexão entre música e sociedade. Nessa perspectiva, a autora agrega ao seu raciocínio que “a emergência do conceito de obra musical necessitou de um novo paradigma para a relação entre compositor e performer, sendo sincrônica à consolidação da burguesia como classe dominante” (DOMENICI, 2013, p. 90).      

É justamente a partir desse viés sociológico que Richard Leppert, em Sight of Sound (1993) estrutura seu estudo acerca da relação entre música, gênero e sociedade. Em seu artigo intitulado A performance musical e o gênero feminino, Catarina Domenici (2013, pp. 90-91) afirma que em muitas de suas análises baseadas em fontes iconográficas, Leppert sugere que há tempos a música “erudita” vem sendo utilizada “como afirmação do poder sociopolítico através do controle sobre o som e sobre o corpo, constituindo-se em metáfora para a ordem social estabelecida pelas classes dominantes”. Assim, em um primeiro plano, a identidade da música erudita “só poderia ser construída em oposição às sonoridades e comportamentos das classes baixas”. Ou seja, sonoridade “desorganizada” em “contraste à noção de uma música organizada pela razão, cujo propósito de dominar a natureza, o som e o desejo encontra na escrita musical um símbolo de poder e prestígio”. 

Nesse cenário, Catarina Domenici atenta para o fato de que a “desordem” pode ser considerada como “um sinônimo da união entre o corpo e o som”. E, em seguida, a autora pondera que a necessidade de oposição entre a música erudita e a música de tradição oral outorga à notação “a função de mediar a relação entre corpo e som, em um esforço que visa assegurar o controle da razão sobre o mundo natural”. Entretanto, no momento da performance, “o texto desaparece, sobrando apenas a música corporificada”. Por conseguinte, aquelas fronteiras entre as classes sociais e, de forma análoga, em outras conhecidas oposições binárias - colonizadores versus colonizados ou, ainda, masculino versus feminino “ameaçam entrar em colapso”. E, nesse processo, a autora sugere que “a garantia do controle depende, em última instância, daquele que executa a notação”. (DOMENICI, 2013, p. 91).      

Particularmente quanto às questões de gênero, ao longo de sua reflexão, Catarina Domenici indaga seus leitores: “O que seria da autoridade do marido, se não houvesse a submissão e a fidelidade da esposa?” E, na sequência, compartilha o arbítrio de John Shepherd, no que se refere à relação que som e escrita estabelecem com a divisão de gêneros. Na opinião de Domenici, às convicções de Leppert, Shepherd acrescenta a ideia de que “o controle unilateral demanda o isolamento e a objetificação”. Para o autor,

"Mulheres, enquanto objetos, são igualadas ao mundo natural ou material e, consequentemente, estão sujeitas ao controle unilateral dos homens. O controle sobre a reprodução cultural compensa a ausência da centralidade no processo biológico de reprodução [...]" (SHEPHERD, 1996, p.154-155 apud. DOMENICI, 2013, pp. 91-92).

A partir das argumentações de Richard Leppert e John Shepherd, a investigadora Catarina Domenici propõe o seguinte entendimento:

O argumento que proponho é que tal mecanismo de controle emergiu não como forma de compensação, mas justamente como construto que reflete o modelo patriarcal de reprodução biológica. Na sociedade patriarcal, a reprodução biológica é o meio de assegurar a continuidade da linhagem masculina [...]. O contrato matrimonial burguês encontra no pacto de fidelidade da esposa o mecanismo que assegura a patrilinearidade. A condição de submissão e objetificação da mulher no casamento burguês é refletida na relação que se estabelece entre compositores e performers no século XIX. [...]. (DOMENICI, 2013, p. 92).

 No sistema patriarcal, para Richard Leppert, secundado por Domenici (2013, p. 93), “os homens eram encorajados a desenvolver uma relação teórica com a música, compreendendo seus aspectos científicos e estéticos”. Por outro lado, as atividades relacionadas com a prática musical poderiam ser exercidas pelas mulheres. Nesse caso, direcionadas costumeiramente ao piano “como forma de entretenimento doméstico despretensioso, pois lhe era vedado desenvolver seus talentos para não competir com o seu marido aos olhos dos outros”.  

No Brasil, ao longo do século XIX e até mesmo nas primeiras décadas do século XX, como bem lembra Robervaldo Linhares Rosa, o piano, por ser uma peça extremamente cara, tornou-se um importante “símbolo de prestígio da elite”. E mais: o aprendizado deste instrumento era uma prática inerente ao processo educacional das meninas pertencentes às famílias mais abastadas. Com efeito, naquele ambiente patriarcal, era comum a participação de mulheres na realização de saraus como forma de entretenimento nos ambientes residenciais. Além disso, ao se revelarem “prendadas”, as senhorinhas poderiam “atrair as atenções de um futuro cônjuge”. Ou seja, “mais do que simplesmente fazer música, cumpriam uma função social” (ROSA, 2020, p. 217).

No entanto, paradoxalmente, naquele tempo o exercício profissional na área de música, por parte das mulheres, não era bem-visto pelo extrato da sociedade que definia os padrões de comportamento. Nesse sentido, sintetiza Rosa (ibidem): “O universo da música esteve por muito tempo de portas fechadas à presença profissional feminina”.

Vale repetir que “a ideia de mudar o status quo é sempre penosa” (ADICHIE, 2012, p. 48). Nesta vereda, em terras brasileiras, foi árdua a tarefa, por exemplo, da “pianeira” carioca Francisca Edvirges Neves Gonzaga (1847-1935) - ou simplesmente, Chiquinha Gonzaga (1847-1935), esta que é constantemente lembrada como um modelo de pianista que conseguiu ultrapassar as barreiras impostas pela sociedade tradicional e patriarcal de sua época, tornando-se, efetivamente, uma artista reconhecida pelo seu trabalho profissional. 

Aliás, uma das legítimas “herdeiras” de Chiquinha Gonzaga foi a pernambucana Amélia Brandão4 (1897-1983) - mais conhecida por Tia Amélia. Esta que, no auge de sua carreira nos palcos e programas de rádio do Rio de Janeiro, por motivos familiares, residiu durante muitos anos na jovem capital do Estado de Goiás. Alguns de seus alunos da cidade de Goiânia, entre eles Heloísa Barra Jardim5 (pianista) e Estercio Marquez Cunha6 (pianista e compositor), tornaram-se nomes importantes da cultura local.

ALGUNS ASPECTOS REFERENTES AO CAMPO DE ATUAÇÃO DA MULHER NA ÁREA MUSICAL EM GOIÁS, ATÉ O FINAL DA DÉCADA DE 1950

Na cidade de Goiânia, constata-se que o estudo do piano, em específico, esteve vinculado, com raras exceções, ao sexo feminino. Esse quadro predominou no Instituto7 de Música da Escola Goiana de Belas Artes (EGBA), fundado pelo belga Jean François Douliez em 1954/55. É pertinente discorrer que o Instituto de Música, após seu desmembramento da EGBA, em 1956, passou a se chamar Conservatório8 Goiano de Música, passando, então, a partir deste ano, a funcionar sob a direção da pianista Belkiss Spenzieri Carneiro de Mendonça em substituição ao maestro Jean Douliez.

Em contrapartida, é correto afirmar que, nas cidades coloniais goianas, a prática de outros instrumentos que não o piano, ao longo do século XIX, foi dominada pelo sexo masculino. Ressalte-se aqui a tradição das bandas de música, como a Banda Phoenix do Mestre Propício (Pirenópolis e Corumbá), fundada em 1893 ou, ainda, a Corporação Musical 13 de Maio, criada em c. 1880, na Cidade de Goiás (Vila Boa).

Outrossim, a partir de 1914, salienta-se também a atuação das diferentes orquestras do cinema9 mudo na antiga Capital: Club Caravana Smart e orquestra do “Cinemas Luso-Brasileiro”, “Cinema Goyano”, “Cinema Iris” e “Cinema Ideal”. Cumpre revelar que houve nesses corpos artísticos a presença de instrumentistas mulheres: das pianistas Nhanhá do Couto, Edméa de Camargo, Antônia Costa Nunes, Suzette Alencastro Veiga, Déborah Tocantins Esteves e Vera Celt; das violinistas Adelaide Rocha Lima Rizzo, Nair Silva, Oyama Bailão e Maria da Conceição Morais (Nazinha).

Figura 1: "Orquestra Ideal" em fevereiro de 1927 (ao fundo: a tela do cinema). Foto10 original cedida pelo compositor Fernando Cupertino

Ao abordar o cenário cultural de Goiânia após a sua inauguração em 1937, nota-se uma expressiva presença feminina nos primeiros recitais promovidos pelos professores Érico Pieper (piano) e Crundwald Costa11 - (violino), já a partir dos anos 1940. O mesmo ocorreu nos conjuntos orquestrais regidos pelo Professor Costinha (Crundwald Costa), entre o final dos anos 1940 até 1954, quando passou a batuta para o maestro Jean Douliez.

Abaixo, a parte interna de um programa de concerto da “Orquestra de Goiânia”, também chamada “Orquestra de Amadores”, datado de 06/06/1950. Nele, observa-se a seguinte e desequilibrada instrumentação: 21 violinos, 1 violoncelo, 1 contrabaixo, 1 flauta, 1 clarineta, 1 saxofone, 1 trompete, 2 trombones e um piano. Nota-se que entre os 21 violinistas arrolados, encontram-se os nomes de 9 mulheres. 

Figura 2: Programa de Concerto da Orquestra de Amadores (06/06/1950). Fonte: Acervo Crundwald Costa

Sob a direção de Jean Douliez, o antigo grupo comandado por Crundwald Costa passou a atender, no decorrer dos anos, por diferentes epítetos: Orquestra da Sociedade de Concertos Sinfônicos de Goiás, Sinfônica12 de Goiânia e, mais tarde, Orquestra Sinfônica da Universidade Federal de Goiás (UFG). Por fim, em 1959, na condição de docente do CGM, o maestro belga participou de um projeto até então inédito no Brasil: a criação de uma orquestra feminina.

A ORQUESTRA FEMININA DO CONSERVATÓRIO GOIANO DE MÚSICA (1959)

A pianista goiana Belkiss Spenzieri13 Carneiro de Mendonça (1928-2005) redigiu, entre os anos de1991 e 2005, uma série de textos para a Coluna “Crônicas e outras Histórias”, parte integrante do Jornal (impresso) O Popular, da cidade de Goiânia. Em 2003, uma coletânea desses escritos foi publicada na forma de livro (físico), sob o título Andanças no tempo. Encontra-se no Capítulo “Memórias que fazem história” (pp. 58-61) de segunda edição (2006), alguns detalhes da efêmera existência de uma primeira Orquestra Sinfônica Feminina em Goiânia, entre os anos de 1959 e 1961.

Preliminarmente, fundamentado na obra supramencionada, temos que: certa vez, em meados de 1959, durante uma reunião do Corpo Docente do Conservatório Goiano de Música (CGM), o professor Jean Douliez aparentava estar desanimado e triste. Em seu relato, a professora Belkiss Spenzieri afirma que, durante aquela assembleia14, o músico belga queixava-se da “impossibilidade de conseguir um bom rendimento dos ensaios da orquestra existente [em Goiânia]”, ou seja, da Orquestra da Sociedade de Concertos Sinfônicos de Goiás”. E, no entender da então diretora do CGM, tal cenário teria sido motivado “pela carência de músicos, sua frequência irregular e pontualidade não observada”.      

Na avaliação de Belkiss Spenzieri, tratava-se de “uma realidade de difícil solução”. Ora, à exceção do regente, não havia qualquer tipo de remuneração para os músicos da Orquestra da Sociedade de Concertos Sinfônicos de Goiás (OSCSG). Na realidade, seus integrantes eram instrumentistas amadores que residiam em Goiânia e que tocavam pelo simples prazer de tocar. Assim, percebendo que o maestro belga estava “vencido e desalentado”, a diretora do Conservatório sugeriu um desafio ao Maestro: fundar uma nova orquestra a ser constituída, exclusivamente pelas alunas15 matriculadas no Conservatório. 

Deste modo, foi criada a Orquestra Sinfônica Feminina do Conservatório Goiano de Música, a qual coexistiu juntamente com a OSCSG. É oportuno explicitar que aquele grupo de existência efêmera (1959 a 1961) também seria referenciado na historiografia musical goiana por Orquestra Sinfônica Feminina de Goiás (OSFG). 

Como era de se esperar, de início, afora a compra dos instrumentos musicais, um outro questionamento aflorou entre os docentes do CGM: “como selecionar as futuras instrumentistas que, em sua quase totalidade, eram pianistas? Como proceder para incentivá-las a estudar um novo instrumento?”. (MENDONÇA, 2006, p. 59). O musicólogo Braz de Pina Filho - professor do Instituto de Artes16 entre os anos de 1974 e 1992 -, deixou anotado nos manuscritos de Memória Musical de Goiânia (publicados postumamente, em 2002) que “a direção do Conservatório fez com que, por meio de uma portaria, os alunos daquele estabelecimento tivessem como obrigatoriedade o estudo de um dos instrumentos próprios da orquestra”, isto paralelamente ao estudo do piano que, à época, era o “instrumento preferido pelos alunos” (PINA FILHO, 2002, p. 68).

Ao que parece, o entusiasmo do corpo docente do CGM foi contagiante. Nesse diapasão, destaca-se, conforme atesta Belkiss Spenzieri que, em algum momento, uma das docentes teria dito às colegas: “Podemos dar o exemplo!” (MENDONÇA, 2006, p. 59). E foi o que se sucedeu: Maria Luíza Póvoa da Cruz (Dona Tânia) e Maria das Dores Ferreira de Aquino (Dona Dorinha) optaram pelo violino; Maria Lucy da Veiga Teixeira (Dona Fifia) escolheu a clarineta; Dalva Maria Pires Machado Bragança decidiu-se pelo oboé; Belkiss Mendonça elegeu o violoncelo como seu segundo instrumento.

Em concordância com Pina Filho (2002, p. 67), aquela empreitada teve Jean Douliez como o único responsável pelo ensino dos instrumentos de corda. Ademais, houve a colaboração externa de professores de instrumentos de sopro: José Alcides Machado (oboé, clarinete e fagote) e Jacy Siqueira (metais e madeiras). Foi nessas circunstâncias que, no decorrer do segundo semestre de 1959, as professoras e alunas arregimentadas para a Orquestra Feminina passaram por um curto período de aulas visando o mínimo de intimidade com os seus novos instrumentos musicais.

Em sua crônica, Dona Belkiss escreve: “após alguns meses de “muita labuta, fomos julgadas capazes de tocar em conjunto”. Os ensaios sucediam diariamente, no período noturno. Mas o efeito foi “uma cacofonia total!” (MENDONÇA, 2006, pp. 59-60). Todavia, os aspectos negativos durante aquele trajeto não foram suficientes para desmotivar as instrumentistas e tampouco diminuir o contentamento17 de Jean Douliez.

Considerando-se as averiguações efetuadas pelos investigadores Borges (1999, p. 118) e Pina Filho (2002, p. 67; 1988, p. 66), a “Orquestra Sinfônica Feminina de Goiás (OSFG)” teria interpretado apenas parte de seu repertório18 - inicialmente escolhido e ensaiado - em sua primeira apresentação pública realizada no dia 7 de dezembro de 1959. Certamente, os autores se orientaram pelo programa19 do recital abaixo, referente a uma das atrações ofertadas durante o Festival20 do Conservatório Goiano de Música. Este que foi um Evento planejado para ser realizado nos dias 7 e 9 de dezembro de 1959, período noturno, no auditório da Escola Técnica Federal de Goiás, atual Instituto Federal de Goiás. 

Figura 3: Parte do Programa do Festival do Conservatório Goiano de Música (7 e 8/12/1959). Fonte: Acervo da Profa. Maria Lúcia Mascarenhas Roriz

Ao se proceder uma contagem da quantidade de músicos (segunda página do programa) da OSFG, constata-se a participação de 43 musicistas na estreia deste corpo artístico. Estranhamente, não constam nessa fonte documental os nomes das professoras do CGM participantes da Orquestra Feminina, isto é, daquelas apontadas pela Professora Belkiss em sua crônica Andanças no tempo.

Como já foi dito, a Orquestra Feminina existiu ao mesmo tempo que a Orquestra da Sociedade de Concertos Sinfônicos de Goiás. Em sua compreensão dos fatos, o musicólogo Braz de Pina sugere que os dois corpos artísticos possuíam finalidades distintas. Enquanto no mais antigo, o maestro Jean Douliez dava continuidade ao trabalho de seus antecessores - Joaquim Édison de Camargo, Érico Pieper e Crundwald Costa -, no outro almejava, sobretudo, “educar a mocidade musical feminina” (PINA FILHO, 1988, p. 68). 

Na opinião de Braz de Pina Filho (2002, p. 68), evidentemente que era difícil se conseguir “algum resultado [musical] positivo em espaço tão curto de tempo”. Ora, para uma análise daquele trabalho, deve-se levar “em consideração o completo desconhecimento de instrumentos de orquestra por parte de muitos dos integrantes desse conjunto”. Apesar disso, por se tratar de uma novidade, a existência daquele corpo artístico foi noticiada em jornais e revistas do Brasil e, também, de alguns países da Europa. A título de exemplo, cita o musicólogo goiano: Revista O Cruzeiro, edição de junho de 1960 (pp. 44-48), e a Revista alemã Praline, publicada em maio de 1961. E, a partir de então, os convites para apresentações fora do Estado de Goiás tornaram-se constantes. (PINA FILHO, 2002, p. 68; 1988, p. 67).

Ainda no arbítrio de Braz de Pina, o próprio maestro Jean Douliez “devia ter consciência da impossibilidade de, em prazo tão curto de aprendizagem e ensaios”, aceitar tais solicitações para concertos. Mesmo assim, sabe-se que a Orquestra Feminina se exibiu na cidade de Belo Horizonte, por ocasião de uma homenagem prestada a um amigo pessoal do maestro belga: o Sr. Juscelino Kubitschek, então Presidente da República.

Ao relembrar aqueles momentos, Dona Belkiss Spenzieri deixa exarada em sua crônica a seguinte frase: “Foi um bom sonho, enquanto durou!”. A autora justifica-se: “os namorados e noivos de suas integrantes começaram a não ver com bons olhos aquele conjunto musical que, além de lhes roubar a atenção das eleitas em todas as noites da semana, até já os separava para as viagens” (MENDONÇA, pp. 60-61). E, em consequência disso, o grupo não tardou a perecer. 

Entretanto, outra versão para o fim precoce da Orquestra Feminina foi contada pelo professor Braz de Pina. Para o musicólogo, o fato principal que determinou o encerramento das atividades daquele grupo deveu-se aos acontecimentos que se seguiram a um concerto realizado em 1961, no qual o maestro Jean Douliez exibiu suas duas orquestras para os participantes de um seminário (sem maiores informações) que reuniu pessoas de várias partes do Brasil.

Naquele concerto, a Orquestra Feminina, que ainda não havia conseguido um nível razoável de aptidão, e que despertava curiosidade mais pelo seu caráter inovador e plástico, a reação foi de “choque” contra os ouvidos de um público que não entendeu aquele tipo de trabalho. Assim, inúmeras frases desairosas foram rabiscadas nos guardanapos da sala de jantar, acompanhadas de muitas outras manifestações de desapreço por parte do público. (PINA FILHO, 2002, p. 71)      

Seja como for, uma outra questão foi levantada pela pesquisadora Sarah Orioli em seu TCC: na criação da Orquestra Feminina do CGM, além dos aspectos musicais e educacionais, houve algum tipo de motivação de cunho feminista? Esse assunto foi um dos temas abordados pelo musicólogo Othaniel Alcântara Jr., por ocasião de uma entrevista iniciada em setembro de 2020, via e-mail, com a pianista, professora e ex-diretora da EMAC/UFG, a Senhora Glacy Antunes de Oliveira. Abaixo, duas perguntas constantes da referida entrevista:

Othaniel Alcântara: (...) Naquela época, além dos motivos inerentes à formação musical, falou-se, em algum momento, naquilo que hoje chamamos de “empoderamento” feminino? 

Glacy Antunes: Não creio que fosse uma questão relacionada ao que hoje se chama de “empoderamento feminino” [...expressado por ações para fortalecer as mulheres e desenvolver a equidade de gênero...].  O exacerbamento da discussão sobre gênero é uma característica da contemporaneidade; aliás, historicamente, sabe-se que a diversidade de gêneros sempre existiu, mas os dias de hoje trazem focos detalhistas ao assunto, com forte impacto na sociedade. Não era uma preocupação quando da criação da Orquestra Feminina, cujo objetivo era incentivar o estudo de outros instrumentos que não o piano. Nós, as alunas/pianistas, gostávamos de música, estudávamos seriamente e encaramos com naturalidade mais um desafio. E o fato de sermos jovens, bonitas, com lindos vestidos, impressionava o público, mas não visava demonstrar que podíamos tocar instrumentos como os homens.

Othaniel Alcântara: A Revista O Cruzeiro (edições: nacional e internacional) fez uma matéria com a Orquestra Feminina. O que a senhora se recorda daqueles dias, nos quais a referida matéria foi feita? As instrumentistas ficaram empolgadas com aquela oportunidade? As fotos no Palácio das Esmeraldas foram feitas exclusivamente para a reportagem? O que mais a senhora pode falar sobre aquele momento histórico?

Glacy Antunes: Dando continuidade à resposta anterior, lembro-me que sim, ficamos empolgadas com a oportunidade de participar da matéria da revista O Cruzeiro. Também foram bons momentos viajar com a Orquestra e tocar no Palácio do Governo, ao qual a maioria de nós nunca teve acesso.  Penso que, para todas nós, foram experiências marcantes, mas logo retornamos às atividades primordiais de nossas vidas, algumas domésticas, muitas professoras/pesquisadoras de música ou não, outras com carreiras diversas; por exemplo, eu não fui a uma das viagens, pois na mesma data participava de um Concurso Nacional de Piano, o que já era meu caminho principal. Também a violinista da foto maior da revista é Ana Maria Pacheco, que estudou música e escultura na UFG, optando posteriormente pela atividade de artista plástica, conquistando carreira internacional.  Hoje ela mora na Inglaterra, onde é artista associada da National Gallery de Londres.

Figura 4: Matéria da Revista Cruzeiro Internacional - junho de 1960 (p. 47). Fonte: Acervo do Prof. Estercio Marquez Cunha

Por fim, sobre o episódio supracitado, destaca-se uma frase marcante do musicólogo Braz de Pina em seu artigo elaborado para a Revista Goiana de Artes: “A Orquestra Feminina deixou de existir para não ressurgir nunca mais” (PINA FILHO, 1988, p. 68). Aqui, torna-se imprescindível noticiar que, após 58 anos, esta “profecia” pôde ser driblada. Trata-se de um novo conjunto orquestral integrado exclusivamente por musicistas, criado em Goiânia, no ano de 2019.

A SEGUNDA ORQUESTRA FEMININA DE GOIÂNIA (2019/2020)

Em 2019, o maestro Eliseu Ferreira da Silva (n.1974) idealizou a formação de uma orquestra em Goiânia, integrada apenas por musicistas, com o objetivo de realizar um concerto especial em homenagem ao Dia da Mulher. Tal apresentação ocorreu na noite do dia 08 de março, no Teatro Goiânia, sob a regência de Katarine Araújo. De acordo com o atual Regente Titular e Diretor Artístico da Orquestra Sinfônica de Goiânia, a ideia foi inspirada na Orquestra Feminina liderada pelo maestro Jean Douliez, entre os anos de 1959 e 1961. Nesse sentido, em entrevista concedida aos autores do presente artigo, em 05/09/2020, via aplicativo Zoom, acrescenta Eliseu Ferreira:

A Orquestra Feminina sempre me exerceu fascínio. A gente já sabia disso pelos livros e pelas histórias. Sabemos que muitas pessoas que convivem com a gente tocaram nessa orquestra e falam com muito fascínio daquela época. E foi algo inusitado ter isso na década de 60 (...). Naquela época, aqui em Goiás, num contexto tão difícil - não tinha tanta gente - tiveram a iniciativa de criar essa orquestra e incentivar pessoas que não tocavam instrumentos de orquestra na época. (SILVA, 2020).

Ainda no tocante às motivações para a criação dessa nova Orquestra Feminina, ao ser indagado sobre a temática feminista, Eliseu Ferreira afirmou quem sim, um dos objetivos deste projeto de 2019 foi evidenciar o empoderamento da mulher no cenário atual. Em sua argumentação, o maestro lembrou que o ambiente sinfônico, até boa parte do século XX, foi exclusivamente masculino.

À essa altura, torna-se relevante trazer a este texto os exemplos de ambiente conservador de duas das mais prestigiadas orquestras europeias: a Filarmônica de Viena e a Filarmônica de Berlim. Na primeira delas, a primeira instrumentista do sexo feminino contratada foi a harpista Anne Lelkes, em 1997. No entanto, a situação vem melhorando bastante. O site oficial daquele corpo artístico informa que, em 2021, dos 138 músicos vinculados àquela Instituição, 18 são mulheres (c.13%). Cumpre informar que um melhor detalhamento estatístico acerca desse e de outros importantes corpos21 artísticos, representantes de diferentes regiões do Planeta, foi preparado por Sarah Orioli Emídio de Souza, visando à finalização de seu TCC junto à EMAC/UFG.

No segundo caso, talvez o exemplo mais citado seja o da musicista Sabine Meyer, quando, em 1982, concorreu a uma vaga de músico efetivo da Orquestra Filarmônica de Berlim. À época, como de costume, a escolha de seus novos integrantes, incluindo seus maestros, era coordenado pelos próprios membros/músicos da Berliner Philharmoniker Foundation. Ao mencionar este momento histórico em seu artigo Dia Internacional da Mulher: Histórias de Luta, publicado no Jornal Gazeta do Povo, em 2013, o maestro Osvaldo Colarusso lembra que as audições daquela entidade eram realizadas em sigilo, atrás de um biombo. Foi naquele contexto que a clarinetista alemã realizou sua prova e, na condição de aprovada, poderia se tornar a primeira mulher a fazer parte daquele seleto grupo de artistas. Entretanto, ao final do pleito, após uma votação (placar: 73x4), a maioria dos músicos da Filarmônica de Berlim “rejeitou uma das melhores instrumentistas da atualidade simplesmente por ser mulher”. 

Retornando ao depoimento de Eliseu Ferreira, percebe-se sua preocupação no sentido de adotar medidas que possam alterar paradigmas e padrões segregacionistas em nossa sociedade:

Como gestor e como educador, tenho a obrigação de contribuir e colaborar para mudar cenários e para mostrar que hoje a gente vive numa sociedade diferente; vive um momento distinto e que a gente tem tantas mulheres galgando postos e ocupando espaços que é delas, por direito, merecimento e competência (...). Então, a ideia da orquestra feminina vem nesse sentido. (SILVA, 2020).

Os eventos artísticos realizados pela mais recente Orquestra Feminina criada em Goiânia tiveram grande reverberação na sociedade goianiense. Isso foi demonstrado no conteúdo das matérias veiculadas em jornais (em todos os seus formatos) e, ainda, por meio de depoimentos encontrados em diferentes redes sociais. A partir de então, surgiram na mídia, ou mesmo em conversas informais, comentários tanto positivos quanto negativos a respeito daquela iniciativa. Em sua maioria, as referências negativas ficaram concentradas no fato de que, na prática, houve uma homenagem às mulheres efetuada pelas próprias mulheres. Curiosamente, uma parte do público, incluindo principalmente pessoas do meio musical, alegou que o “correto” seria atribuir tal incumbência aos homens.

À época, ao rebater as supramencionadas críticas, o maestro Eliseu Ferreira reiterou que o objetivo primordial do projeto era mostrar as capacidades e habilidades das mulheres, provar que elas eram capazes. Na aludida entrevista concedida aos autores desse texto, Eliseu acrescentou:

Qual seria a homenagem ideal às mulheres? Um presente? Mostrar para as outras mulheres justamente o potencial, a força, uma ação afirmativa, mostrando que a mulher está aí, tem a capacidade, tem habilidade equivalente e, às vezes, até melhor em determinadas áreas. E que não precisa ficar com esse racismo, com esse machismo tão fora de moda. E que qualquer iniciativa que venha mostrar isso, mesmo que seja no dia da mulher, colocando as mulheres para trabalhar, é justamente isso, mostrar essa questão, então a homenagem é nesse sentido. (SILVA, 2020). 

No primeiro concerto desta Orquestra, realizado no dia 8 de março de 2019 - Dia da Mulher -, a maestrina Katarine Araújo contou com a participação de 10 solistas e de 49 musicistas de fileira, entre elas a pesquisadora Sarah Orioli, coautora deste artigo. E, em razão da grande repercussão daquele evento, a iniciativa foi repetida no dia 8 de março de 2020, também no Teatro Goiânia, mas, desta feita, às 11 horas. Nesta segunda oportunidade, a maestrina contou com mais 13 artistas, totalizando 62 instrumentistas, além de 3 solistas. 

No mais, além dos dois concertos explorados neste artigo, sabe-se que, durante o período da “Quarentena” decorrente do surgimento da COVID-19, parte daquele grupo deu prosseguimento àquela iniciativa ora documentada. Surgiu, assim, um conjunto musical menor: uma camerata feminina. Desde então, foram organizados uma série de apresentações no formato online. Nesta fase dos trabalhos, para quase totalidade das aparições na internet, o maestro Eliseu Ferreira escalou apenas as instrumentistas de cordas entre aquelas musicistas que mantêm vínculo empregatício com o Poder Público Municipal.

Figura 5: Parte do programa da Orquestra Feminina (08/03/2019). Fonte: Acervo de Sarah Orioli

A RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS

O presente estudo emergiu do uso combinado da abordagem quantitativa com a abordagem qualitativa de pesquisa. Para tanto, a investigação trilhou diferentes fases, tais como: o levantamento bibliográfico, a busca por fontes documentais primárias e entrevistas com regentes e instrumentistas. Ademais, em 2021, a flautista Sarah Orioli, utilizando-se dos recursos oferecidos pelo aplicativo google forms, elaborou dois questionários semelhantes, os quais, por meio de duas redes sociais (WhatsApp e Instagram), foram encaminhados a dois grupos distintos de sujeitos: 1) Para as demais ex-integrantes da Orquestra Feminina, aquela que esteve em atividade nos anos de 2019 e 2020; 2) Para instrumentistas do sexo masculino vinculados a dois corpos artísticos: Orquestra Sinfônica Jovem de Goiás (mantida pelo Estado de Goiás) e Orquestra Sinfônica de Goiânia (mantida pela Prefeitura de Goiânia). 

Nesta etapa da investigação, buscou-se apreender a percepção das musicistas, não apenas sobre aspectos musicais, mas quanto ao entendimento das integrantes da mais recente Orquestra Feminina, no que se refere às questões de gênero. Do inquérito constaram perguntas sobre feminismo, sexismo no ambiente musical, misoginia, ações afirmativas, além de colher opiniões em relação à importância ou não, da criação e atuação daquele conjunto orquestral.

Perguntas semelhantes foram adaptadas e enviadas a instrumentistas do sexo masculino, entre aqueles artistas que, de uma forma ou de outra acompanharam os trabalhos coordenados pelo maestro Eliseu Ferreira em parceria com a maestrina Katarine Araújo. Pretendeu-se, aqui, captar o entendimento desses artistas no tocante à temática do feminismo. Em seguida, após cotejadas, as respostas colhidas nos dois modelos de inquérito deram subsídio à preparação de dados estatísticos, inclusive com a geração de gráficos. Abaixo destacamos alguns dos resultados obtidos na análise efetuada pela pesquisadora Sarah Orioli.

Particularmente no tocante ao primeiro grupo de entrevistados, foram devolvidos 32 formulários devidamente preenchidos. Desse total, registra-se que 16 (50%) das instrumentistas mulheres participaram das duas apresentações em homenagem ao Dia da Mulher (2019 e 2020). Da outra metade, 9 (28,1%) e 7 (21,8%) integraram, respectivamente, as formações de 2019 e 2020. Sendo assim, o total de sujeitos entrevistados da primeira versão do conjunto foi de 25 musicistas (78,1%) e em 2020, 23 musicistas (71,9%). No montante das estatísticas iniciais elaboradas para a presente pesquisa há outros detalhamentos como, por exemplo, o percentual de artistas em cada naipe das orquestras. 

Quanto às respostas obtidas, no primeiro caso, 28 sujeitos (87,5%) alegaram que suas participações na Orquestra Feminina se deveram ao fator “obrigatoriedade”, visto que todas possuem vínculo com pelo menos um corpo artístico mantido pelo Poder Público: Orquestra Sinfônica de Goiânia, Orquestra Sinfônica Jovem de Goiás, Orquestra Sinfônica Pedro Ludovico Teixeira ou a Orquestra Juvenil Joaquim Jayme.

Curiosamente, independentemente da forma de ingresso na Orquestra Feminina, se obrigatória ou não, a maioria das musicistas inqueridas (71,9%) aprovaram a ideia do Projeto. Em outro momento, entre as respostas válidas a percepção das participantes ficou assim distribuída: não vai dar certo: 6,3%; ficaram animadas com a novidade: 62,5%; foi injusto os homens serem dispensados e o grupo trabalhar apenas com as mulheres: 9,4%; não imaginei que somente mulheres poderiam formar uma orquestra: 3,1%.

Uma pergunta, em especial, foi dedicada à Orquestra Feminina que esteve em atividade na cidade de Goiânia, entre os anos de 1959 e 1961. Para as integrantes da mais nova versão da orquestra feminina, a maioria (78,1%) respondeu que não sabia da existência daquele corpo artístico regido pelo maestro Jean Douliez.

Sobre a temática do feminismo, foram dedicadas três questões. Inicialmente, ao serem indagadas se a criação da Orquestra Feminina (2019) foi, na realidade, uma estratégia relacionada com algum tipo de movimento feminista, a pesquisadora obteve o seguinte resultado das entrevistadas: não (56,3%), sim (25%), não sabem (18,8%). 

Figura 6: Gráfico 1 (temática do feminismo)

Nas duas perguntas seguintes, à exceção de uma artista, as participantes continuaram oferecendo suas contribuições para a presente pesquisa. No que se refere à importância do feminismo e, ainda, sobre a necessidade de adoção de ações afirmativas como forma de combater os preconceitos, foram somados: sim (83,9%), não (9,7%), não sabem (6,5%). Por fim, o questionário revelou que, embora mais de 80% das instrumentistas julgarem o feminismo importante, apenas 67,7% delas se considera feminista. No mais, 25,8% não se considera feminista; 6,5% não sabem e uma pessoa não respondeu.      

Destaca-se, ainda, a opinião das musicistas quanto ao repertório apropriado para uma orquestra feminina. Afora uma primeira pergunta alusiva à relação nível do grupo versus escolha de repertório, um outro questionamento foi dedicado a um aspecto concernente ao tema do feminismo. Nesse caso, um pouco mais da metade do total das entrevistadas (62,5%) arbitraram ser importante um grupo com tais características executar exclusivamente obras compostas por mulheres, como aconteceu no concerto em homenagem ao Dia da Mulher, versão 2020.      

Outro aspecto abordado na pesquisa foi aquele inerente à perspectiva das artistas no que tange à recepção desse trabalho por parte do público goianiense. Considerando a impressão das instrumentistas, temos: sim (84,4%), não (6,3%), não souberam responder (9,4%).      

Como foi dito, devido às limitações de espaço, apenas parte dos dados procedentes dos questionários aplicados no desenvolvimento da presente pesquisa foram apresentados nesse artigo. Cumpre esclarecer que, além das perguntas objetivas foram solicitadas respostas para indagações do tipo: “O que é feminismo pra você?”, “Na sua opinião, quais são os maiores desafios de uma mulher no mundo musical? ”, “o sexo interfere na escolha do instrumento musical? Planeja-se para a versão final deste estudo (TCC), deixar documentada uma série de depoimentos emitidos a partir de perguntas constantes dos inquéritos. 

Finalizando, desse material, no entanto, alguns comentários chamaram a atenção pelo lado negativo da atuação das recentes orquestras femininas. Nesse sentido, algumas entrevistadas confessaram não ter enxergado qualquer tipo de engajamento feminista no projeto. Ao contrário, em síntese, foram registrados três tipos de sentimentos: 1) foram tratadas como objeto de apreciação visual; 2) foram usadas como ferramentas em ações de cunho político; 3) foram envolvidas em uma jogada de marketing.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Deve-se ter em mente que este artigo constitui apenas uma das fases entre aquelas necessárias para a finalização da presente pesquisa. Sendo assim, é importante confessar que as considerações finais apresentadas aqui, não pretendem ser conclusivas.

Neste estudo, partiu-se da compreensão da chamada sociedade patriarcal, a qual encontrava-se bem arraigada até as primeiras décadas do século XX. Depois, entrou-se no universo das novas perspectivas de estudos possibilitadas pelo advento de uma nova corrente de pensadores adeptos da New Musicology, entre elas as aludidas questões de gênero estimuladas por Susan McClary (n. 1946) ou Susanne Cusik (n.1954), entre outros autores. Em seguida, trilhou-se pelo caminho apontado por Richard Leppert, Catarina Dominici e John Sheppherd, este que sugeriu uma conexão entre a situação de submissão da mulher - própria da sociedade patriarcal- com a relação que se estabelece entre as atividades composicional e de performance.      

Ao trazer a discussão para o cenário goiano, inicialmente constatou-se a existência de uma expressiva participação de mulheres nos saraus, corais religiosos e, sobretudo, nas orquestras do cinema mudo, criadas nos anos 1910 e 1920, na antiga Capital. De uma análise da historiografia musical goiana, salienta-se o enfoque dado pela musicóloga Maria Augusta Calado - professora aposentada da EMAC/UFG -, ainda na década de oitenta, no tocante ao peculiar papel exercido pelo sexo feminino em diversos setores da sociedade vilaboense do período pós-mineratório.

Com a transferência da Capital da Cidade de Goiás para Goiânia (1937), esta que foi planejada e construída sob a bandeira do progresso e da modernidade, o ambiente cultural goianiense efervesceu nas décadas seguintes. Nesse contexto, nota-se, sem surpresa, a quantidade de mulheres violinistas que integraram os conjuntos instrumentais liderados pelos maestros Joaquim Édison de Camargo, Érico Pieper e Crundwald Costa, nos anos 1940 e 1950. Isso, antes da fundação do Conservatório Goiano de Música (1956), o qual, por iniciativa da pianista Belkiss Mendonça e do maestro Jean Douliez, ambos professores daquela Instituição de ensino pioneira em Goiânia, acampou uma exótica orquestra feminina considerada pela Revista Cruzeiro (Internacional) como sendo a primeira da espécie criada no Brasil.      

Particularmente no que se refere à música de orquestra, sabe-se que, ao longo do tempo, sua prática, em geral, não foi comum a homens e mulheres. A título de exemplo, podem ser mencionadas as Orquestras Filarmônica de Viena e de Berlim. Da mesma forma, ressalta-se que o processo de inserção feminina na direção de orquestras sinfônicas ou filarmônicas ocorreu costumeiramente de forma tardia no Brasil. Cite-se o caso da norte-americana Marin Alsop (n. 1956) que, em 2012, tornou-se a primeira Regente Titular e Diretora Artística da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP). E, no Estado de Goiás, ao que tudo indica, o pioneirismo na direção desses grandes corpos artísticos pertence à maestrina goiana Katarine Araújo que, após ocupar o posto de Regente Assistente da Orquestra Experimental de Repertório (SP), vem acumulando os cargos de Regente Titular do Coro Sinfônico de Goiânia e da Camerata Feminina.      

Por intermédio de entrevistas realizadas com duas musicistas entre aquelas que fizeram parte da primeira orquestra feminina (1959-1961), chegou-se à conclusão que, diferente do que foi observado nas orquestras formadas nos anos de 2019 e 2020, a gênese da Orquestra Feminina do Conservatório Goiano de Música não esteve relacionada com o que chamamos hoje de “empoderamento feminino”.

Quanto aos questionários aplicados às musicistas da segunda orquestra feminina, os pesquisadores receberam com surpresa alguns dos resultados obtidos. Um deles, por exemplo, foi o fato de o inquérito ter apontado que a maioria das instrumentistas (78,1%) respondeu que não sabia da existência daquele corpo artístico regido pelo maestro Jean Douliez entre o final da década de 1950 e início da década de 1960. Nesse diapasão, como forma de manter viva a memória musical da região, não seria o caso de tornar obrigatória uma disciplina de História da Música em Goiás na matriz curricular da EMAC/UFG?      

Em outro momento, mais especificamente no rol de perguntas descritivas, alguns poucos comentários chamaram a atenção - de forma negativa - no que diz respeito à existência de uma orquestra feminina como sendo uma das possíveis ações afirmativas de combate à discriminação de gênero na sociedade brasileira. Nesse sentido, registra-se que algumas entrevistadas confessaram não ter enxergado qualquer tipo de engajamento feminista no projeto. Ao contrário, em síntese, foram registrados três tipos de sentimentos: 1) foram tratadas como objeto de apreciação visual; 2) foram usadas como ferramentas em ações de cunho político; 3) foram envolvidas em uma jogada de marketing.      

Finalizando, acredita-se que, atualmente, seja consenso entre os musicólogos a importância de se discutir a presença das mulheres nos diversos campos profissionais da música. Sendo assim, pretende-se com a presente pesquisa dar prosseguimento a essa luta em prol de uma sociedade mais justa e com igualdade de direitos e de oportunidades.

REFERÊNCIAS

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NOTAS:

1 Segundo Reitsma (2014, p. 40), nos anos 1970, algumas musicólogas mais corajosas começaram a escavar a história da participação da mulher na música. São os casos das compositoras Hildegard von Bingen (1098 e 1179), Barbara Strozzi (1619-1677), Clara Schumann (1819-1896), Ethel Smyth (1858-1944) e Ruth Crawford Seeger (1901-1953). Para a autora, aspectos ideológicos ou mesmo aqueles atrelados às tradições de um determinado povo, a exemplo do “patriarcado”, escondeu a maioria da produção musical feminina durante séculos. Contribuíram para a falta de reconhecimento profissional dessas artistas fatores como, por exemplo: status social, questões físicas e emocionais.

2 É preciso ter em mente que a conceituação básica da dualidade “feminino” e “masculino” na música, encontra-se na prática de reflexão acerca das propriedades estéticas das características de gênero socialmente construídas dentro da música (REITSMA, 2014, p. 40).

3 Em Feminine Endings, conforme as argumentações de Inês Thomas Almeida (2017, pp. 01, 05, 07-08), pela primeira vez, de maneira consciente, são utilizadas as ferramentas do feminismo no campo da análise musical. Acrescenta Almeida que alguns aspectos relevantes na obra musical são: “o papel pioneiro de crítica feminista em musicologia, ter obrigado a uma reflexão sobre significado em música, ter colocado em cima da mesa o debate sobre questões de género e sexualidade na música e sobretudo ter provocado o alargamento a outras perspectivas, dando impulso a uma profusão de estudos musicológicos que incluem género, sexualidade, corpo, queer, feminismo, mas também política, sociedade, participação, como algo natural”. Em sua recensão crítica elaborada para a FCSH da Universidade Nova de Lisboa, Almeida afirma que Feminine Endings “causou um enorme furor quando da sua publicação em 1991, gerando “uma enorme onda de reacções e muita contestação”. Almeida lembra que a maior polêmica relacionada com o trabalho de Susan McClary foi, sem dúvida, a metáfora criada e publicada na 1ª edição de Feminine Endings. Trata-se de um comentário a respeito de um trecho do primeiro movimento da Nona Sinfonia de Beethoven, “como sendo o ímpeto incontrolado de um violador incapaz de satisfazer os seus impulsos”. É relevante informar que McClary retirou essa passagem na 2ª edição do livro (2002).

4 Recentemente, o pesquisador Othaniel Alcântara publicou uma biografia de Tia Amélia. Link para o início do texto: https://www.aredacao.com.br/colunas/154411/othaniel-alcantara/amelia-brandao-a-pianista-que-venceu-o-preconceito 

5 Heloísa Barra Jardim: Sua trajetória artística nos anos 1940 e 1950 - “Meu amigo era o piano!”. (ALCANTARA-JR, 2021). Link: https://www.aredacao.com.br/colunas/151200/othaniel-alcantara/heloisa-barra-jardim-sua-trajetoria-artistica-nos-anos-1940-e-1950 

6 Conversando com o músico Estercio Marquez Cunha. Artigo publicado no Jornal A Redação. (ALCANTARA-JR, 2021). Link: < https://www.aredacao.com.br/colunas/153915/othaniel-alcantara/conversando-com-o-musico-estercio-marquez-cunha >.

7 Jean Douliez e a criação do Instituto de Música da EGBA. Artigo publicado no Jornal A Redação. (ALCANTARA-JR, 2021). Link: https://www.aredacao.com.br/colunas/149522/othaniel-alcantara/j-douliez-e-a-criacao-do-instituto-de-musica-da-egba-1954-55 

8 Na década de 1950, além de Jean Douliez e Belkiss Spenzieri, o Conservatório Goiano de Música contava com mais quatro docentes, todas pianistas: Maria Lucy da Veiga Teixeira (Dona Fifia), Maria Luíza Póvoa da Cruz (Dona Tânia), Dalva Maria Pires Machado Bragança e Maria das Dores Ferreira de Aquino (Dona Dorinha).

9 Othaniel Alcântara publicou, em 2016, um artigo alusivo às orquestras do cinema mudo em Goiás. Artigo publicado no Jornal A Redação. Link: https://www.aredacao.com.br/colunas/74111/othaniel-alcantara/os-musicos-do-cinema-mudo-em-goias 

10 Uma cópia da foto acima (em preto e branco), bem como sua legenda, encontra-se disponível no livro A Modinha em Vila Boa de Goiás (p. 60) elaborado pela musicóloga Maria Augusta Calado de Saloma Rodrigues. Em pé: pianista Edméa Camargo ladeada pelos flautistas Armando Esteves (esq.) e Donizetti Martins de Araújo. Sentados (da esq. para a dir.): João Ribeiro da Silva (bombardino), Antônio Valeriano da Conceição (clarineta), Ovídio Martins (violino), Maria da Conceição Morais "Nazinha" (violino), Júlio Alencastro Veiga (violino) e Athayde Paulo de Siqueira "Dico" (flauta). 

11 “Crundwald Costa e as sementes da modernidade”. Capítulo 2 do Livro Projeções Críticas da Modernidade: modernismos e modernidades a partir da experiência goiana. (ALCANTARA-JR, 2018). Disponível no Link: https://www.amazon.com/Modernidade-Modernismos-modernidades-experi%C3%AAncia-Portuguese-ebook/dp/B07N7KP9TC

12 Cumpre esclarecer que, embora chamada de “sinfônica”, aquele corpo artístico era, na realidade, uma orquestra de câmara formada por músicos amadores.

13 Existe uma incongruência na ficha catalográfica entre os dois livros de autoria da Profa. Belkiss S. C. de Mendonça no que diz respeito ao seu primeiro sobrenome: Spencière (1981) e Spenzieri (2006).

14 Braz Wilson Pompeu de Pina Filho (1946-1994), na página 67 de seu livro Memória Musical de Goiânia (publicação póstuma: 2002), comunica que a supradita reunião foi realizada “em fins de julho de 1959”. Para Borges (1999, p. 117), a ideia de se criar uma orquestra integrada apenas por mulheres foi apresentada, discutida e aprovada em reunião pelo Conselho Técnico Administrativo do CGM, no dia 7 de agosto de 1959.

15 Na prática, algumas professoras do Conservatório também foram integrantes da Orquestra Feminina. Em 1959, além de Jean Douliez e Belkiss Spenzieri, o Conservatório Goiano de Música (CGM) contava com mais quatro docentes, todas pianistas de formação: Maria Lucy da Veiga Teixeira (Dona Fifia), Maria Luíza Póvoa da Cruz (Dona Tânia), Dalva Maria Pires Machado Bragança e Maria das Dores Ferreira de Aquino (Dona Dorinha).

16 Vale lembrar que o Conservatório Goiano de Música foi criado em 1956. Mas, em 1960, quando anexado à recém-criada Universidade Federal de Goiás (UFG), passou a se chamar Conservatório de Música da UFG. Em 1972, teve sua denominação alterada para Instituto de Artes da UFG. Entre 1996 e 2000, ficou conhecido como Escola de Música e, desde então, responde pelo nome de Escola de Música e Artes Cênicas (EMAC/UFG).

17 Para Mendonça (ibidem), Douliez “feliz e orgulhoso com o resultado obtido, mandou timbrar papéis de carta com o seu nome e o título [por ele escolhido] ‘Diretor da Orquestra Sinfônica Feminina de Goiás’”.

18 Em suas lembranças, Mendonça (2006, p. 60), declara que três obras foram escolhidas para integrarem o repertório inicial da Orquestra Feminina do CGM: Em um Mercado Persa de Albert Ketèlbey (1875-1959), Aquarela do Brasil de Ary Barroso (1903-1964), além de um pot-pourri de temas brasileiros, arranjados pelo maestro Jean Douliez, sob o título: Brasiliana.

19 O programa de concerto inserido no corpo do texto possui um total de 4 páginas. Outros corpos artísticos participaram do Evento: o Coral do CGM, regido por Dona Fifia; um Trio formado pelos violinistas Cecília Furukawa e Luiz Antônio Curado e pela pianista Heloísa Barra Jardim e, ainda, a Orquestra da Sociedade de Concertos Sinfônicos, regida por Jean Douliez, conjunto instrumental este que coexistiu com a Orquestra Feminina. Certamente, a principal atração daquelas noites foi a montagem da Ópera infantil (em um ato), escrita por Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791). Entretanto, a fonte documental ora apresentada, não informa o repertório executado pela OSG, tampouco se instrumentistas (todos amadores) desse grupo participaram da montagem da Ópera infantil Bastião e Bastiana de W. A. Mozart.

20 Não se deve confundir esse evento com o “Festival de Música Erudita do Estado de Goiás”, criado em 1967, pela iniciativa da direção do Conservatório de Música da UFG (antigo CGM). É relevante esclarecer que, atualmente, o mencionado Festival é promovido pela Escola de Música e Artes Cênicas de Goiás, uma das Unidades pertencentes à Universidade Federal de Goiás (EMAC/UFG). 

21 Filarmônica de Nova Iorque, Filarmônica de Berlim, Sinfônica de Londres, Concertgbouworkest (Amsterdã), Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP) etc.